Aqui ontem as crianças brincavam, hoje só sobra o lixo. Montanhas disformes em sacos de plástico preto, tomando a calçada e avançando para a pista. Os ratos passam céleres: rápidos e leves, podem correr por sob seus pés sem que você perceba. Ao chegar ao ralo do bueiro, porém, se tornam cautelosos. Esticam o corpo cinza-amarronzado para dentro e desaparecem no escuro. A cauda continua à vista, quinze centímetros pra fora, dura e balançante como uma antena, enquanto o dono esgueira-se esgoto adentro.
As baratas, também. De cada orifício de tampa de bueiro proliferam, marrons e brilhantes como que envernizadas. Tão grandes que arrastam consigo pedaços de comida maiores que o próprio corpo. Quanto mais abundância, mais ávidas ficam: correm para lá e para cá, frenéticas, vivendo o risco do esmagamento sob solas distraídas.
Do fedor não é preciso dizer. Alguém lembrou bem, "cheira à carniça", e ruas inteiras estavam tomadas por aquela fetidez. A nuvem de pestilência cobria quarteirões: o solo, ar e água, sujeira no mais alto grau, por onde quer que se olhasse, sem escapatória. "Essa é a 'cidade maravilhosa'", pensei comigo mesmo, prendendo a respiração e segurando o nojo, "o Rio de Janeiro das montanhas de lixo e baratas envernizadas".
Impossível não deixar a mente cantarolar a canção: O Rio de Janeiro continua lindo.
ResponderExcluirSerá?
Bem oportunamente, aliás: estamos em época de eleições municipais...
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