This story is fiction, and any events or near-similar events in actual life which did transpire have not prejudiced the author toward any figures involved or uninvolved; in other words, the mind, the imagination, the creative facilities have been allowed to run freely, and that means invention, of which said is drawn and caused by living one year short of half a century with the human race . . . and is not narrowed down to any specific case, cases, newspaper stories, and was not written to harm, infer or do injustice to any of my fellow creatures involved in circumstances similar to the story to follow.


(Charles Bukowski, "The Murder Of Ramon Vasquez")

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Pobre de espírito

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-"A pior miséria é a espiritual", ele disse. "É olhar pro céu e ver a lua, mas não poder alcançá-la porque os pés estão enterrados na lama".

-"Mas quem é pobre de espírito quer alcançar a lua?", perguntei.

-"Claro. Assim como o pobre de grana olha o ouro do rico e quer pra si".

Bem pensado. O céu é um burguês avaro e queremos expropriá-lo de estrelas.

Uma nova ida ao freezer para pegar mais cerveja. Ela estava lá, dançando com os outros. Eu deveria dançar também se quisesse ter alguma chance, mas ficava cá ouvindo sobre assaltos ao céu.

-"Ei, traz pra mim também!", gritou o filósofo da varanda onde estávamos.

-"Escute, cara, não faz sentido isso que você falou", eu disse entregando a cerveja gelada. "Você está sofismando. O pobre de espírito sequer tem noção da beleza da lua. Olha pra ela e só vê um pedaço bobo de rocha flutuando. Sua comparação com pobres, ricos e ouro é inadequada".

Ele gargalhou, abrindo a lata sonoramente. Na sala transformada em pista o clima esquentava, e ela lá no meio dançando com os idiotas.

Eu continuei, disposto a provar meu ponto: -"O pobre REAL quer o ouro do rico porque sente uma necessidade REAL. O estômago ronca, o corpo sente frio, e o ouro serve para corrigir isso. Mas o pobre ESPIRITUAL não tem noção de sua fome, de sua necessidade. Olha pra lua e não vê nada de mais, prefere continuar na lama. Só iria querer a lua se tivesse conhecimento de sua riqueza, mas se tivesse conhecimento da riqueza da lua não seria mais um pobre de espírito. Portanto, você está sofismando". E também abri minha latinha.

Dessa vez ele me olhou sério, desceu outro gole, então riu baixinho pra si próprio. -"Vem cá", começou, "o estômago não sabe de sua fome, sabe? Mas é uma necessidade...O ESPÍRITO também sente essa necessidade. Mesmo que não saiba. E na maioria das pessoas não sabe mesmo". E mandou ver outro gole.

Silêncio. Ele terminou a lata e acendeu um cigarro, olhando pro povo dançando na sala. Continuamos o xadrez mental. Até que, por volta das 3 da manhã, desligaram o som e eu já estava empapuçado de cerveja.

Foi então que percebi ela, num cantinho escuro da parede, aos amassos com um indivíduo. Fiquei com cara de bunda, naturalmente, e o filósofo percebeu.

-"Pô, véio", ele disse me dando um tapinha nas costas. "-Perdeu esse tempo todo no papo furado aqui ao invés de chegar nela? Que merda, hein?"

Daí dei um soco nele. Pano rápido.

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