Entardecia e, por mais não ter o que fazer, fiquei a observar as pessoas. Naquela esquina estava por exemplo um senhor grisalho, bem vestido mas não formal a ponto de ser um advogado. Falava ao celular: e foi o modo como falava que atraiu minha atenção. Olhos vermelhos, expressão tensa, parecendo ao mesmo tempo resignado e desesperado, sol e chuva, a encarnação das antíteses. E falava pouco. Apenas monossílabos ao aparelho, basicamente confirmando, endossando, aquilo que o interlocutor falava. Mas como lhe parecia sofrido! Engolia a explosão e se resignava em silêncio.
Que diabos ouvia? Estava longe para captar alguma coisa e sou ruim de leitura labial. Portanto resta apenas conjeturar, digamos, a notícia da demissão, da traição da esposa, da morte de alguém, o meteoro implacável rumo à Terra, uma nova epidemia mortal, uma declaração de guerra, qualquer uma dessas pequenas notícias banais da vida mundana que nós recebemos, rotineiramente, pelo celular num entardecer do centro da cidade.
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